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Em Salvador, Liberatum debate diversidade e políticas públicas: ‘os negros no Brasil estão sendo mortos todos os dias’, diz Seu Jorge

O segundo e último dia de painéis do festival internacional Liberatum no Brasil foi realizado em Salvador neste sábado (4). Os cantores Seu Jorge e Karol Conká, e as atrizes Luana Xavier e Rossy de Palma foram as atrações mais esperadas pelo público. O cantor carioca falou sobre o que considera um ‘genocídio’ dos jovens negros no Brasil.

Outros nomes como Tânia Neres, coordenadora de Diversidade, Afroturismo e Povos Originários da Embratur; a modelo inglesa Paloma Eselsser; os artistas Teodoro, Hiran, Bernardo Conceição.

O primeiro dia de evento foi na sexta-feira (3), quando a atriz estadunidense Viola Davis foi uma das convidadas.

Neste sábado, complementaram as atrações os empresários e investidores Paulo Rogério, Alan Soares, Monique Evelle, Maurício Mota e Nina Silva; o filósofo Marcelo Zig e o psicológico Kito Gois.

Liberatum em Salvador — Foto: Tatiana Azeviche/Setur

Liberatum em Salvador — Foto: Tatiana Azeviche/Setur

Nesta reportagem, o g1 resume algumas das falas mais impactantes das atrações, por ordem de apresentações. Confira mais abaixo:

Paulo Rogério:

“O que a gente quer é um futuro diferente para o nosso povo, para mudar o destino de mazelas que foram provocadas ainda lá atrás, por meio da escravidão. A tecnologia chega para privilegiar poucas pessoas, mas empreendedorismo não é algo pra poucas pessoas. Nós, enquanto pessoas negras, sempre fomos empreendedores. Nós criamos o samba, criamos a capoeira, nós que inventamos os blocos afro, a música mundial é preta. Nos Estados Unidos, [criamos] o jazz, o rock, o blues; aqui no Brasil, todas as vertentes musicais são nossas. O problema: quem ganha dinheiro com essa cultura?”.

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Tânia Neres:

Liberatum teve debates sobre afrofuturismo e diversidade — Foto: Itana Alencar/g1

Liberatum teve debates sobre afrofuturismo e diversidade — Foto: Itana Alencar/g1

“Vamos trazer de volta todas as histórias que foram apagadas e vamos contar a verdade, porque agora a gente conta a verdade. Antes disso, a história era contada pelo opressor, que podia contar o que quisesse e a gente teria que aceitar. Eu fico muito feliz em ver que na academia, há mais ou menos 20 anos, quando nós, pessoas negras, começamos a ocupar as universidades, começamos a estudar sobre nós, por que não tínhamos nossa história contada, então fomos procurar nossa história. E no momento que a gente procura nossa história, achamos personalidades de resistência. Para além de Zumbi dos Palmares, para além de Luiz Gama, começamos a encontrar. Muitos personagens — personagens importantes — que podem empoderar as pessoas e que podem também mostrar pro mundo, para o mercado, incluindo o estrangeiro, o quão poderoso a gente é em tudo”.

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Paloma Elsesser:

“Precisamos procurar ter diversos profissionais negros ao nosso redor, em nossa vida. Modelos negros, advogados negros, médicos negros. Precisamos de pessoas que possam nos ajudar a refletir sobre a necessidade de estarmos em nossas comunidades, em relação a sermos um corpo político, não de sermos perfeitos. Enquanto a precariedade das nossas vidas continuar nas mãos de pessoas brancas, não podemos parar de pensar a respeito de nossa emancipação”.

Teodoro:

“Nos colocar em determinados espaços, agora, acaba soando como uma estratégia da própria mídia que, depois de tanto tempo, nos entendeu enquanto potencial econômico de demanda popular. Óbvio que esse processo contribui pra que mais de mais pessoas consigam ter referenciais, mas ainda me questiono: até que ponto, de fato, nós estamos construindo essas narrativas, ou a gente ainda está numa disputa por espaço? Me incomoda muito, e às vezes eu percebo essa necessidade de nos sentirmos representados em coisas que não são necessariamente sobre a gente. Precisamos, de fato, fazer versões negras de personagens brancos, para que a gente tenha um espaço no imaginário? Eu acho que a gente tem que construir uma narrativa que seja nossa”.

Seu Jorge:

Segundo dia de Liberatum teve Seu Jorge e  Rossy de Palma — Foto: Itana Alencar/g1

Segundo dia de Liberatum teve Seu Jorge e Rossy de Palma — Foto: Itana Alencar/g1

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“É muito importante imaginarmos, juntos, políticas efetivas. Não somente de inclusão, mas de combate a determinadas coisas que acontecem dentro da sociedade, sobretudo com a juventude. Nós temos, no Brasil em particular, uma preocupação muito grande com a mortandade da juventude negra. Os negros no Brasil estão sendo mortos todos os dias, como se fossem moscas, e isso é completamente diferentes da realidade da juventude branca, com poder aquisitivo. É necessário o combate da desigualdade, porque o genocídio é um fruto dessa distorção, dessa incapacidade da gente de gerir a segurança e o futuro dessa juventude tão potente, e isso vai custar muito caro no futuro do nosso país”.-

Rossy de Palma:

“Como é que eu tenho algo que eu não escolhi ter, e as pessoas me culpam por isso? O gênero, a cor da pele, as características, tudo isso são coisas que nós não escolhemos. É uma loteria da vida. É uma loteria nascermos neste país e não naquele. É uma loteria que faz com que nossas vidas sejam totalmente diferentes”.

Hiran:

“A gente tem que fazer as pessoas acreditarem que elas podem, sim, mudar o mundo. Hoje eu vivo da minha arte e propago mensagens que são o oposto do que eu acreditava, por tudo de ruim que eu tinha vivido. Outras pessoas que estão nesses lugares precisam acreditar que podem sair dali, para criar uma realidade de perspectivas diferentes. Tudo que está aí de ruim faz a gente achar que o nosso destino é um sonho. Tudo começa na cabeça, tudo começa em você fazer a pessoa acreditar”.

Alan Soares:

“É óbvio que existe a culpa do homem branco, do escravizador, de quem manteve e mantém o processo racista, mas a responsabilidade da mudança é nossa. Tem que ser nossa, para que a gente escolha como vai ser. Uma das responsabilidades de nós, como comunidades, de estarmos numa situação de índice de desenvolvimento humano precário, é a nossa falta de responsabilidade nas nossas escolhas, de quem a gente consome, quem a gente contrata. É preciso que a gente faça parte dessa mudança. A gente precisa confiar no nosso discernimento, para sermos agentes da mudança”.

Monique Evelle:

“O capitalismo está colapsando porque eles preferem perder grana, do que ver a gente aqui, como liderança”.

Evento teve mesas com temas ligados à população negra — Foto: Itana Alencar/g1

Evento teve mesas com temas ligados à população negra — Foto: Itana Alencar/g1

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Maurício Mota:

“A gente tem uma mentalidade de intuição, o conceito de intuição, de sexto sentido, de ‘algum anjo veio e sussurrou no seu ouvido’, e aí você tomou a decisão. O que eu aprendi, trabalhando na área de educação, é que intuição é o casamento perfeito entre lógica e experiência de vida. O mercado não quer que a gente vá profundamente na periferia, para entender quais são as demandas de saneamento, de educação, de negócios, de financiamento. Não quer isso, porque eles querem que o saco de dinheiro fique num certo lugar”.

Nina Silva:

“Nós temos que lembrar o que o racismo faz e fez com o nosso psicológico, o que traz no nosso dia a dia, do auto-ódio que ele gera. E além do auto-ódio, o racismo é ainda mais eficaz, principalmente no Brasil, trazendo o lugar do preto único — que é a reprodução do topo para algumas pessoas. Se fala por aí: ‘pretos no topo’, esquecendo que, para o preto estar no topo, alguém tem que estar na base. E o meu diálogo é: por que a gente precisa de topo? Por que a gente precisa manter uma pirâmide de opressão, dentro de um sistema colapsado e obsoleto, como o sistema que opera as nossas políticas e economias?”.

Luana Xavier:

“Não adianta de nada a gente ter um grande talento, se a gente não procurar o máximo de conhecimento que a gente tiver sobre aquilo. E uma coisa que eu gosto de repetir sobre o nosso povo preto é que: definitivamente, o conhecimento não está apenas dentro da academia. A gente tem que pensar nas nossas baianas de acarajé, nas nossas mães pretas que são mães solo, que cuidam de suas famílias —que entendem profundamente de economia doméstica, mesmo nunca tendo assistido nenhuma aula sobre o assunto, e que entendem de educação e conseguem educar seus filhos, às vezes nunca tendo entrado numa escola, nunca tendo completado o primeiro grau ou o segundo grau —. Então é pensar que conhecimento tem muitas fontes”.

Bernardo Conceição:

“É um privilégio ser um negro solteropolitano, porque a cidade me ensina muito mais do que às outras pessoas negras que nascem fora do país. Mas também tenho que conviver com pessoas negras e enxergar que, as pessoas que são meus pares, não participam de decisões assertivas na cidade”.

Karol Konká também participou do festival em Salvador — Foto: Itana Alencar/g1

Karol Konká também participou do festival em Salvador — Foto: Itana Alencar/g1

Karol Conká:

“Em 2021, quando eu senti a dor da rejeição, o que mais eu estranhei foi, justamente, a falta de atitude sobre aquilo que é pregado dentro de nosso movimento. Eu esperava que, saindo daquele reality, ao menos me dessem umas palmadas, mas ao mesmo tempo me acolhesse, porque ninguém erra porque quer, sabe? E quando eu percebi o sofrimento e a dor, eu vi o quanto nosso movimento ainda precisa evoluir mais. Porque não é possível que depois de tudo o que aconteceu, tudo o que eu fiz 30 dias dentro de um reality, as pessoas simplesmente acharam que tinham certeza de quem sou eu. Vocês não têm nenhuma ideia de quem sou eu”.

Marcelo Zig:

“A pessoa com deficiência traz à tona o que é essencial no ser humano, que é a relação de interdependência. Somos essencial e socialmente interdependentes, mas em razão de um sistema econômico, a gente nega essa relação de interdependência e vivemos na captura de uma ilusão que não existe que essa ideia da independência. Ninguém é independente”.

Kito Gois:

“As histórias devem servir para gerar inspiração e não comparação. Eu costumo dizer: você é o resultado daquilo que você faz todos os dias. A pergunta é o que a gente faz todos os dias? Toda história é digna de ser contada. E a terapia é exatamente esse lugar, é o lugar onde nós tornamos aquilo que é dito, intencional. Então, eu não digo simplesmente como uma experiência catártica, eu passo a dizer com intenção”.

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O festival

Festival Liberatum reúne multidão em Salvador — Foto: Divulgação/Liberatum

Festival Liberatum reúne multidão em Salvador — Foto: Divulgação/Liberatum

🏟️ A maioria dos eventos do Liberatum ocorreu no Centro de Convenções de Salvador, na orla da Boca do Rio.

🎉Também aconteceram eventos exclusivos para convidados, como um jantar em um tradicional restaurante do bairro do Comércio em homenagem à cantora maranhense Alcione.

Neste domingo haverá um show gratuito na Praça Cayru no dia 5 de novembro. E na segunda-feira (6), uma mesa com o vencedor do Nobel de Literatura Wole Soyinka encerra o evento.

📖Programação principal:

  • 5 de novembro
    16h – Show na Praça Cayru com:
    Honraria à Angela Bassett
    Ground Zero Blues Club + Lazzo Matumbi
    Ilê Aiyê e convidados
    Afrossinfônica convida Luedji Luna e Psirico
  • 6 de novembro
    15h – Wole Soyinka – Museu Nacional de Cultura Afro-Brasileira (Muncab)

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